A crise energética mundial, ocorrida em 1973, teve diversas consequências para a sociedade: alertou para a necessidade de economia de energia; incentivou o aproveitamento de fontes renováveis; mostrou a importância da reciclagem de resíduos de processamento e sucatas.
O lixo sólido urbano apresenta uma grande variedade de componentes. O número de habitantes, o nível educacional, o poder aquisitivo, as condições climáticas, os hábitos e os costumes da população são fatores que influenciam diretamente na composição do lixo municipal. Esses materiais variam em natureza e proporção, conforme o local e a época do descarte, a natureza do refugo, o teor de umidade etc. É importante saber se o material já foi beneficiado por coleta seletiva ou semisseletiva, que remove do lixo os produtos de maior importância econômica, como as garrafas PET.
Os componentes principais desses resíduos pós-consumidos são: papel, plástico, vidro, metal, matéria orgânica e outros, como folha seca, trapo, madeira, borracha e etc.
O metal
Os metais são bens econômicos escassos e não renováveis. Embora o Brasil seja o maior produtor de minério de ferro do mundo e possua vastas jazidas de minérios de cromo, manganês e alumínio, o País não é autossuficiente na produção de alguns metais não ferrosos, como o cobre, o chumbo, o zinco, o níquel e o mangnésio.
As embalagens metálicas são de diversos tipos, destacando-se as embalagens de aço e de alumínio.
No processo primário, o metal resulta da redução do minério de ferro a temperaturas muito elevadas, com alto consumo de energia. No processo secundário, o metal provém da fusão do material já usado, sucata, e o consumo de energia é menor. Essas embalagens apresentam um alto potencial de reciclagem porque o material tem a possibilidade de ser processado inúmeras vezes, sem perda de suas propriedades, produzindo lingotes ou laminados. Os produtos metálicos reciclados mostram-se tão bons quanto os produtos primários para a maioria das aplicações. Entretanto, a condutividade elétrica e a resistência à corrosão podem sofrer alteração por diminutos teores de impurezas metálicas ou por elementos não metálicos introduzidos na reciclagem.
O vidro
O vidro é um material obtido da fusão de compostos inorgânicos, como areia, barrilha, calcário e feldspato, a temperaturas da ordem de 1500°C. A sílica, SiO2, é o principal componente do vidro; é encontrada abundantemente na Natureza, sob a forma de areia. Tem alta temperatura de fusão. Depois de fundido, o vidro é moldado em formas metálicas e resfriado sob temperaturas escalonadas.
A reciclagem do vidro se dá sem perda de volume ou das propriedades. No processo de reciclagem, é utilizado cerca de um quarto de matéria-prima reciclada sob a forma de cacos, que são reduzidos de tamanho, lavados e totalmente liberados de impurezas. Depois são adicionados à mistura de matérias-primas, que é transformada em garrafas, potes e frascos novos.
Assim, a fabricação do vidro a partir dos cacos economiza energia gasta na extração, no beneficiamento, no transporte dos minérios não utilizados e na própria transformação. A economia de energia é a principal vantagem do processo de reciclagem do vidro e se reflete também na maior durabilidade dos fornos.
O papel
Basicamente, o papel é composto de fibras celulósicas obtidas da madeira; essas fibras podem ser primárias, quando provenientes de matéria-prima natural, ou secundárias, quando já passaram por máquinas de fabricação de papel.
Para ser reciclado, o papel não deve conter impurezas, como: corda, barbante, metal, vidro, pedra, madeira e plástico. São proibitivos: papel vegetal; papel-carbono; papel e cartão impregnados com substâncias impermeáveis à umidade, como parafina, cola, silicone, revestimento plástico ou metálico; papel sujo, engordurado ou contaminado com produtos químicos nocivos à saúde; papel sanitário usado, como papel higiênico, papel-toalha, guardanapo e lenço de papel.
O papel que será reciclado percorre uma cadeia formada por catadores, pela indústria de papel, pelo mercado consumidor e depois volta novamente aos catadores. Passa por processo manual de separação, escolha, classificação e enfardamento. Depois de coletado e selecionado, o papel sofre o processo de reciclagem propriamente dito. Nessa etapa, ele é desfibrilado em meio à grande volume de água. A massa formada pode passar entre cilindros e ser transformada em diferentes tipos de papel de várias espessuras, ou em papelão, ou pode produzir polpa. Nesse último caso, a massa de papel é colocada em formas de metal e comprimida para a remoção da água.
Na reciclagem do papel, muitas vezes não é necessário o branqueamento, pois o material pode ter cor amarelada e se enquadrar em uma categoria inferior. O produto final da reciclagem é o papel ondulado. Não se usam técnicas de limpeza fina, como retirada de tintas e lavagens especiais para branqueamento do material. Entretanto, é preciso deixar claro ao consumidor que o produto assim reciclado mantém bactérias, contaminantes e impurezas iniciais e, tal como ocorre com o plástico reciclado, não tem qualidade para uso em contato com alimentos, medicamentos ou cosméticos.
Recicla-se a apara de papel até a perda da fibra, isto é, três vezes. O padrão de qualidade do material baixa a cada ciclo de uso-descarte-recuperação. Esse problema pode ser minimizado pela adição de material celulósico de fibra longa, como papel Kraft. O produto desfibrilado pode ser aproveitado como matéria-prima celulósica para a fabricação de celulose regenerada (ou raiom viscose), acetato de celulose, metilcelulose ou carboximetil celulose.
A reciclagem do papel apresenta algumas dificuldades:
• falta de homogeneidade das aparas;
• necessidade de eliminação das impurezas presentes na massa, provenientes da desagregação do papel;
• descarte e tratamento dos rejeitos gerados;
• produtos de papel cada vez mais sofisticados em sua fabricação, de difícil reciclagem;
• extensão territorial do Brasil, pois o custo do transporte pode inviabilizar o aproveitamento de aparas.
O plástico
Os plásticos, as borrachas e as fibras são constituídos principalmente de polímeros, que são moléculas em cuja estrutura se encontram unidades químicas simples, repetidas, denominadas meros.
Os polímeros podem ser classificados em dois grandes grupos quanto ao seu comportamento quando aquecidos.
• termoplásticos, os que fundem por aquecimento e solidificam por resfriamento, reversivelmente; por exemplo, o polietileno e o poli (tereftalato de etileno), isto é, o PET;
• termorrígidos, aqueles que, por aquecimento, sofrem reação química e se transformam em massa insolúvel e infusível, como a resina fenólica e a borracha vulcanizada. Esses são os termorrígidos químicos. Há também materiais do tipo termorrígido físico, em que as ligações intermoleculares são hidrogênicas, como é o caso da celulose do papel.
O comportamento mecânico é também uma forma bastante utilizada para classificar os polímeros:
• borrachas ou elastômeros, materiais que, à temperatura ambiente, exibem elevada elasticidade, suportando grandes deformações sem ruptura, com rápida e espontânea retração ao tamanho original;
• plásticos, materiais que se tornam fluidos por ação da temperatura e podem ser moldados por pressão; tornam-se sólidos por resfriamento;
• fibras, materiais que apresentam alta resistência mecânica e elevada razão entre as dimensões longitudinal e transversal.
Desses tipos de material polimérico, os plásticos são os que se encontram mais presentes no lixo; ocupam grande volume em relação ao peso, o que os tornam mais visíveis, como poluidores do meio ambiente.
A borracha
Os pneus são constituídos de borracha natural e sintética vulcanizada, que são polímeros termorrígidos. Quando abandonados inadequadamente, os pneus servem como local para procriação de mosquitos, pequenos roedores e outros vetores de doenças, além de representarem um risco constante de incêndio, o que contamina o ar com uma fumaça negra altamente tóxica, com presença de um óleo que se infiltra e contamina o lençol freático.
As tecnologias mais comuns para dar destino aos pneus usados, além de sua reutilização, são a composição asfáltica, a reforma, a regeneração, a pirólise e a reciclagem energética.
Os pneus descartados podem ser reutilizados pela engenharia civil, na manutenção de encostas, ou reciclados para outras funções. Podem ainda ser incorporados, em pedaços ou em pó, ao asfalto empregado na pavimentação de rodovias. Esse processo apesar de apresentar maior custo, tem a vantagem de duplicar a vida útil das estradas, pois confere ao pavimento propriedade de maior elasticidade diante das mudanças de temperatura, além de diminuir o ruído dos veículos que circulam na rodovia e reduzir o armazenamento de pneus velhos.
Existem, basicamente, dois processos para reforma de pneus:
• remoldagem – o pneu é reconstruído pela substituição da banda de rodagem, dos ombros e de toda a superfície de seus flancos;
• recauchutagem – o pneu é recuperado pela troca apenas da banda de rodagem.
Para a reforma do pneu, é fundamental que a sua estrutura geral não apresente cortes e deformações e que a banda de rodagem ainda tenha os sulcos e saliências originais, condições para sua aderência ao solo.
Para a grande maioria dos processos de reciclagem, há necessidade de reduzir tamanho das partículas do pneu, além de separar a borracha das partes metálicas e do náilon. Assim, a granulação é a primeira etapa a ser feita para a recuperação do pneu; nesse processo, geralmente os constituintes são separados. A reciclagem do pneu é mais dispendiosa que a do plástico porque a borracha está vulcanizada, enquanto o plástico presente no material pós-consumido é, em geral, termoplástico.
O pneu pode ser utilizado como fonte de energia pela sua queima, o que caracteriza a reciclagem energética. O maior problema ambiental encontrado nesse processo é a emissão de gases, como dióxido de enxofre, que podem levar à precipitação de chuvas ácidas. Assim, torna-se necessário o tratamento desses gases, o que encarece o processo.
Na fabricação do cimento, o pneu é utilizado como combustível no forno da cimenteira e suas cinzas são agregadas ao cimento no próprio forno.
A matéria orgânica
A matéria orgânica encontrada nos refugos municipais contém essencialmente restos de alimentos. Quando se trata de áreas rurais, o lixo ainda contém grama e resíduos de animais. Além disso, inclui também palhas e folhas secas, ricas em celulose. Esse material heterogêneo é rico em nutrientes para micro-organismos, que se desenvolvem com facilidade e provocam fermentação. Essa é matéria-prima excelente para a produção de fertilizantes orgânicos, designados como compostos, obtidos no processo de compostagem.
Compostagem consiste na estabilização biológica da matéria orgânica pela ação controlada de micro-organismos, para transformá-la em compostos ou húmus. É uma técnica tradicional de tratamento para o lixo urbano. A produção e a utilização do composto permitem reconstituir e manter o ciclo da matéria orgânica, indispensável ao equilíbrio ecológico do solo. Os compostos, embora pobres em macronutrientes, como nitrogênio, fósforo e potássio, fornecem diversos micronutrientes às plantas. O seu efeito mais notável é a bioestruturação do solo, a redução da erosão, o aumento da aeração, a retenção de água, a penetração das raízes e, assim, o aumento da vida dos micro-organismos presentes no solo. Restos de alimento, esterco de animais e aparas de grama, folhas e galhos constituem materiais que podem ser compostados.
Pequenas composteiras podem ser empregadas com bom resultado, fazendo a compostagem em pilhas para a geração de grandes volumes de produto e associando o trabalho da compostagem com o de minhocário.
Para a produção de um composto de lixo com aspecto satisfatório para a venda ao agricultor, é importante evitar a presença de inertes, também denominados contaminantes. São partículas grosseiras, como cacos de vidro, de louça, pedaços de plástico ou de metal, papel, pedras e outros, que podem ser removidos por meio de catação e de peneiramento final do produto acabado.
O sistema de descarte seletivo domiciliar em lixo seco – embalagens de papel, lata, plástico, vidro, trapo – e lixo úmido (ou molhado), composto de matéria orgânica, permite obter resíduos orgânicos mais nobres, potencialmente isentos desses contaminantes, uma vez que o nível de qualidade do composto irá depender da origem e da natureza da matéria-prima.
Os resíduos da construção civil
Os materiais usados na construção civil constituem uma grande fonte de resíduos sólidos. São constituídos de uma ampla variedade de produtos, que podem ser classificados em:
• solo – material não consolidado, geralmente proveniente da decomposição de rochas, que engloba matéria orgânica, inorgânica e vida bacteriana;
• materiais cerâmicos – compostos por rochas naturais; concreto; argamassas à base de cimento e cal; resíduos de cerâmica vermelha, como tijolos e telhas; cerâmica branca, especialmente a de revestimento; cimento-amianto; gesso e vidro;
• materiais metálicos – como aço, latão, chapas de aço galvanizado etc.;
• materiais orgânicos – como madeira natural ou industrializada; plástico diversos; materiais betuminosos; tintas e adesivos; papel de embalagem; restos de vegetais e outros produtos de limpeza de terrenos.
De maneira geral a quantidade de resíduos da construção, gerada nas cidades, é igual ou maior que a produzida pelos domicílios.
A reciclagem dos resíduos da construção civil consta de uma etapa de seleção em três grupos:
• materiais compostos de areia, cal e cimentos, por exemplo, concretos, argamassas e blocos de concreto;
• materiais cerâmicos, por exemplo, telhas, manilhas, tijolos e azulejos;
• resíduos não utilizados no agregado, por exemplo, solo, vidro, plástico, madeira e outros.
Depois de separado, os resíduos são triturados, obtendo-se, então, os agregados reciclados que podem ser utilizados na fabricação de peças pré-moldadas não estruturadas, agregados para sub-base de pavimentos, guias e sarjetas, e blocos de concreto de vedação. Parte dos resíduos da construção civil pode ser reutilizada na própria obra para fechamento de valas e a construção de contrapisos. O agregado reciclado apresenta qualidade inferior ao agregado tradicional, pois suas características variam de um lote para outro, em razão da heterogeneidade dos resíduos.
Fonte:
BONELLI, Cláudia M.C. MANO, Eloisa Biasotto; Pacheco, Élen Beatriz A.V. Meio Ambiente, Poluição e Reciclagem. 2. ed. São Paulo, 2010.(p.101-110).